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A corrida por proteínas fluorescentes vermelhas

Ao trazer a fluorescência das proteínas ainda mais para o vermelho, os bioengenheiros estão expandindo a paleta e a profundidade de penetração da imagem biológica. Neste post, descubra os últimos desenvolvimentos no terreno das proteínas fluorescentes vermelhas.

Para falar um pouco sobre o desenvolvimento de tecnologias fluorescentes, que visa expandir as possibilidades de marcações com diversos fluoróforos, traduzimos o artigoThe hunt for red fluorescent proteins” da autora Amber Dance, publicado no início de agosto. Nos próximos parágrafos o leitor encontra o texto (com alguns poucos adendos nossos) contendo dicas de ferramentas interessantes para quem mexe com fluorescência e informações sobre o estado da técnica dessas proteínas.

Do verde ao vermelho nas proteínas fluorescentes

A proteína verde fluorescente (Green Fluorescent protein – GFP em inglês) é um dos itens mais populares na caixa de ferramentas do microscopista. É uma inovação que levou os cientistas Osamu Shimomura, Martin Chalfie, Roger Y. Tsien ao Prêmio Nobel de química em 2008. A GFP ilumina brilhantemente moléculas de interesse em uma ampla gama de campos biológicos, laboratórios e técnicas. Mas não funciona para a química física Julie Biteen.

Biteen estuda comunidades de bactérias intestinais na Universidade de Michigan em Ann Arbor, e estava ansiosa para usar proteínas fluorescentes para identificar espécies individuais em misturas complexas. Mas as bactérias intestinais não gostam de oxigênio, algo que a proteína verde fluorescente (GFP – em inglês) absolutamente requer. Sem oxigênio, sem fluorescência.

Então, ela se voltou para um identificador molecular que poderia funcionar sem oxigênio. Uma adição relativamente nova à paleta de proteínas fluorescentes, IFP2.0 fluoresce principalmente no infravermelho – uma parte do espectro eletromagnético que é quase invisível ao olho humano, mas facilmente capturado pelas câmeras de um microscópio. “Estamos muito animados”, diz Biteen. “Pudemos ver células individuais e identificá-las.”

A imagem na extremidade vermelha do espectro oferece outras vantagens: menor interferência de fundo, toxidade reduzida e penetração de tecido mais profunda. “Todos os outros fatores sendo o mesmo, quanto mais vermelho, melhor,” diz Robert Campbell, um engenheiro de proteínas que passa metade de seu tempo na universidade de Tokyo e a outra metade na universidade de Alberta em Edmonton, Canada. Isto também provê uma maneira de adicionar outra tonalidade, ou duas, para experimentos. “Quanto mais canais conseguirmos compactar em um experimento, sem interferência cruzada significativa, mais interações nós podemos estudar,” diz Talley Lambert, um microscopista na escola de medicina de Harvard em Boston, Massachusetts.

Proteínas fluorescentes avermelhadas existem a décadas, mas elas geralmente ainda não são páreas para proteínas verdes fluorescentes em termos de brilho e tonalidades. Até mesmo as proteínas vermelhas fluorescentes (RFP – na sigla em inglês) são mais próximas de laranja. Cientistas estão fazendo progresso em desenvolver proteínas que são verdadeiramente vermelhas – frequentemente chamadas “vermelhas distantes”. Para distingui-las de tentativas prévias, o infravermelho oferece vantagens similares. Este desenvolvimento ainda está na sua infância, mas avanços em bioprospecção, engenharia de proteínas e química sintética estão ajudando a melhorar os laboratórios.  A maioria está disponível, na forma de gene, no repositório de plasmídeo Addgene.

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Isto é claramente uma necessidade, cientistas urgem por marcações e sensores que funcionem em conjunto com ferramentas padrões, como proteínas verdes fluorescentes, marcações azuis para DNA e canal rodopsinas, as quais são ativadas por luzes azuis e verdes. Brian Almond, gerente sênior de gerenciamento de produtos na Thermo Fisher Scientific em Carlsbad, California, diz que uma tonalidade alternativa é frequentemente o primeiro pedido dos clientes para novas ferramentas fluorescentes. “tudo é verde,’ eles dizem. “Por favor, não o torne verde”

Solução escarlate

Um experimento típico de microscopia de fluorescência pode usar cerca de três cores sem sobreposição. Mas escolher etiquetas que funcionem juntas não é tão simples quanto amarelo-verde-azul. Existem centenas de proteínas fluorescentes para escolher, e elas variam em fatores como tonalidade, brilho e longevidade de fluorescência. Algumas são proteínas de unidade única, mas outras têm o potencial de aderir umas às outras e talvez até mesmo colar a proteína de interesse a outras semelhantes, interferindo nos resultados. Nenhuma proteína será a melhor para todas as aplicações.

Ao escolher uma marcação, é melhor não confiar muito nos dados publicados, avisa Roberto Chica, engenheiro de proteínas da Universidade de Ottawa. As proteínas que funcionam bem em um tubo de ensaio podem não brilhar em um organismo modelo e as tabelas de dados costumam ser incompletas. É melhor testar algumas proteínas fluorescentes e escolher a melhor para seus experimentos.

Vários recursos online gratuitos podem ajudar os cientistas a escolher proteínas fluorescentes candidatas, incluindo FPbase de Lambert; Fluorescence SpectraViewer da Thermo Fisher; e o Fluorescence Spectra Analyzer desenvolvido pela BioLegend em San Diego, Califórnia. Os usuários podem visualizar as curvas de excitação e emissão de centenas de proteínas e corantes fluorescentes e, ao inserir suas fontes de luz, filtros e detectores, podem escolher de acordo.

Uma estratégia para usar cores múltiplas é permitir que os computadores classifiquem quaisquer espectros de emissão sobrepostos após os dados serem coletados. Com esta técnica, chamada de ‘imagem espectral e mistura não-linear’ ou ‘mistura não-fluorescente’, os pesquisadores podem sondar muito mais cores – até 40 marcações no mesmo experimento de citometria de fluxo, diz o gerente de produto da BioLegend, Kenta Yamamoto. Mas esses painéis de arco-íris exigem um planejamento cuidadoso, ele avisa: por exemplo, proteínas mais raras podem precisar ser combinadas com marcações mais brilhantes se quiserem se destacar da multidão.

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Uma abordagem mais simples é usar uma cor que não se sobreponha a nenhuma das outras. É aí que as etiquetas de vermelho extremo (ou distante?) e infravermelho próximo são úteis; eles tornam mais fácil obter pelo menos quatro sinais não sobrepostos das mesmas células. Em seu laboratório na Westlake University em Hangzhou, China, o desenvolvedor de ferramentas Kiryl Piatkevich registra rotineiramente cinco sinais da mesma lâmina de microscópio usando três cores visíveis e duas na faixa do infravermelho próximo. Muitas vezes, esses experimentos podem ser realizados sem grandes atualizações de equipamento.

Onde o fluoróforo cresce

Enquanto muitas proteínas fluorescentes são encontradas em criaturas marinhas, as moléculas do vermelho distante e do infravermelho próximo tendem a vir de bactérias. Mas, ao contrário da GFP e de proteínas semelhantes, os receptores de luz bacterianas carecem de um componente para absorver luz (chamado cromóforo) por conta própria; eles requerem a adição de um pigmento conhecido como biliverdina. A boa notícia é que a biliverdina é um intermediário natural na degradação do heme, que se liga ao oxigênio para transportá-lo através do sangue, por isso está naturalmente presente nos mamíferos. A má notícia é que a biliverdina também é degradada rapidamente, por isso está longe de ser abundante.

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Uma solução para esse problema é adicionar mais biliverdina, seja de fornecedores químicos convencionais, seja alterando os organismos para fazer mais dela. Outra é criar proteínas naturais do vermelho extremo (distante?) e do infravermelho próximo para que funcionem melhor fora de seu hospedeiro normal, por exemplo, aumentando a eficiência da ligação entre a proteína e o pigmento, diz Vladislav Verkhusha, bioengenheiro molecular do Albert Einstein College of Medicine em New York City. Seu grupo induz mutações aleatórias nos genes relevantes in vitro, então expressa esses genes na bactéria Escherichia coli e seleciona os produtos mais vermelhos ou mais brilhantes. Em um exemplo, a equipe usou 17 rodadas dessa abordagem de evolução molecular para obter uma marcação de proteína infravermelha próxima chamada miRFP670nano. A marcação tem cerca de 60% do tamanho da RFP, liga-se à biliverdina de forma eficiente e apresenta fluorescência brilhante em células de mamíferos.

Piatkevich também usa a evolução molecular, mas em células de mamíferos, que dobram as proteínas de modo que elas se pareçam mais com as das células-alvo do que as desenvolvidas nas bactérias. Sua equipe usou essa abordagem para iluminar um reporter de voltagem fluorescente próximo ao infravermelho (útil para rastrear o disparo de células nervosas), criando um sensor chamado Archon1.

Também é possível projetar proteínas diretamente. Timothy Wannier, um biólogo sintético da Harvard Medical School, usou a evolução molecular e a análise e design de proteínas baseadas em computador em parentes da RFP durante seus estudos de doutorado no California Institute of Technology em Pasadena. Seu objetivo era transformar proteínas fluorescentes vermelho-distantes diméricas em monômeros, o que ajudaria a prevenir interações indesejáveis. Mas ele também teve que criar mutações para estabilizar os monômeros solitários.

Uma das marcações resultantes, mKelly1, chamou a atenção de Yi Shen, um engenheiro de proteínas da Universidade de Alberta, que a usou para construir sensores de cálcio muito vermelhos chamados FR-GECOs.

Mais vermelho, o tempo todo

Apesar desses avanços, as proteínas fluorescentes do vermelho distante e do infravermelho próximo permanecem lâmpadas fracas. Enquanto algumas proteínas verdes ultrapassam os limites de brilho, as melhores marcas do infravermelho próximo oscilam em torno de 10 a 20% do máximo.

Uma solução é uma “gambiarra” alternativa com base em corantes químicos de vermelho distante e infravermelho próximo, que também estão se tornando mais amplamente disponíveis. O químico orgânico Luke Lavis do Howard Hughes Medical Institute Janelia Research Campus em Ashburn, Virgínia, desenvolveu corantes brilhantes e não tóxicos que podem alternar entre as formas incolor e fluorescente de acordo com o ambiente. Lavis, desde então, se uniu ao colega engenheiro de proteínas Eric Schreiter para transformar esses corantes em sensores celulares “Quim genéticos” que acoplam um corante químico a um parceiro proteico.

O par usa o ‘HaloTag’ geneticamente codificado como um dock para os corantes sintéticos e o conecta a proteínas sensoras que mudam de forma na presença de cálcio ou voltagem elétrica. A mudança de forma altera o ambiente local do corante de tal forma que fica fluorescente – e é cerca de dez vezes mais brilhante do que os sensores vermelhos anteriores, diz Schreiter. Lavis dá os corantes para outros cientistas gratuitamente. Ele agora está testando os corantes de próxima geração que espera que penetrem mais profundamente no tecido para aplicações in vivo.

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“O futuro é brilhante para esta classe de sensores”, diz Schreiter. Ele acrescenta que deve ser possível substituir a RFP em qualquer sensor pré-existente pelo HaloTag para criar um novo sensor Quim genético vermelho. Mas para o resto do arco-íris, diz Lavis, as proteínas fluorescentes padrão devem bastar “porque são fantásticas”.

Nature 596, 152-153 (2021)

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13/10/2021
Postado por Débora Moretti
Categoria: Entrevistas
Pesquisadora na Universidade de Bonn, Alemanha e co-founder/CMO na iBench.

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